O Encontro Nu

Cap. XI:

Na manhã seguinte, Gaio comportou-se demonstrando visivelmente que o efeito entorpecente, causado pelas impressões maravilhosas que obtivera da bela jovem da biblioteca, sobre ele não passara. Avoado, de manhã não assistiu às aulas práticas na faculdade de maneira satisfatória. Também não dormira direito, visto que as imagens do debate, mais especificamente de tudo o que transcorrera entre ele e ela, reverberaram e ainda reverberam com insistência em sua cabeça. Pensava tanto na jovem que, não sabia o motivo, o rosto dela começava a borrar-lhe na memória. Talvez fosse a beleza fulgurante dela a sobrecarregar-lhe os sentidos, embotando-os. Mas a verdade é que a imaginava em tantas situações inefáveis com ele que seu cérebro já se confundia em meio a todas essas reconstituições mentais dela. No fim da aula, Gaio planejava procurar informações a respeito dessa jovem que lhe conquistara o coração. Iria, primeiro, à Biblioteca Central para ver se achava alguém que a conhecia e, também, para aproveitar para verificar se encontrava algum registro dela na lista dos presentes no debate literário de ontem. Só não fazia a menor ideia de como poderia identificá-la. Se tivesse sorte, com enorme trabalho poderia descobrir, por comparação e exclusão manual, o perfil dela na comunidade virtual da Biblioteca, um perfil que tinha de contar com foto, já que ele mesmo mantinha um com livre acesso. Então, se fosse necessário, poderia estar apto a levantar mais dados sobre ela, suficientes para inclusive localizá-la no domicílio. Mas, afinal, quantas pessoas faziam parte mesmo da comunidade virtual da Biblioteca? Não eram milhões?! Estava definitivamente em apuros!

Conforme prometera à mãe, Gaio estava de fato empenhado em relegar por um tempo suas preocupações existenciais e idealistas. Por certo que a paixão fulminante e repentina o ajudava, e muito. Mas já vinha pretendendo experimentar sensações novas além de outras, heterodoxas, era verdade, que já vinha experimentando:

– Não sei quem espalhou, mas todo mundo na faculdade está sabendo que eu ultimamente venho praticando nudismo solitário em uma área reservada do Jardim Botânico da cidade – confessou Gaio a Polaris ao passo que saíam andando, carregando finos computadores de colo nas mãos feito valises, da Universidade Octogonal da Grande Zona Sul, ao término das aulas experimentais. – Não ligue, amigo, mesmo ciente de que muita gente tenha feito comentários maldosos de você – disse Polaris com franqueza.

– De novo, voltei a ser comentado, muito comentado, por sinal, e, também, não muito bem comentado, em um lugar onde faço a parte presencial de meus estudos. – Gaio falava com ironia de si próprio. – Mas não dou a mínima para o que eles acham de mim, pode ficar tranquilo. Vez por outra, é eu que me preocupo com eles, com a insignificância de suas preocupações. Não projeto o meu para-si no mundo, não na presença do outro.

– De quando em quando, também me dá vontade de radicalizar, de fazer algo que choque os costumes, entende? Mesmo nossa sociedade de longe sendo tão liberal como nenhuma outra antes. Para tanto, o que me falta mesmo é só ação. Coragem, aposto que tenho.

– Entendo – disse Gaio e os dois resolveram parar, à sombra de um medrado flamboyant, com a intenção de observar as belas colegas que passavam tagarelas junto ao fluxo de estudantes na aleia da vasta praça defronte da universidade. A iniciativa tácita parecia ter sido tomada por Gaio, o qual procurava ávido, mas discreto, entre um rosto e outro, o da jovem que o enguiçara. Em vão, fizera o mesmo a manhã inteira, no afã de tentar verificar se ela estudava na mesma universidade que a sua.

– Na verdade, quando pratico o nudismo, meu propósito não é bem o de chocar os costumes. Não tem nada de mais ficar pelado, ora! Se assim o fosse, eu o praticaria dentro das comunidades naturistas engajadas. O que eu quero... e isso pode ou, não, deve soar ridículo aos outros... é tentar passar por uma experiência mais próxima possível dos outros animais em nosso habitat original. Isso nos ajuda percebermos quão frágeis nós somos. Sem tanga, sem nada, quero igualmente, de quebra, ver se consigo lidar melhor com minha timidez ao expor por completo meu corpo a um ambiente relativamente aberto e estranho. Além disso, já lhe disse que eu quase sempre durmo nu. Precisa experimentar, porque é uma delícia. É gostoso se acariciar no colchão e no lençol e ser acariciado pelos ventos que entram pela janela quando a deixamos aberta. Isso é uma mania antiga minha, não sei direito o que a causa. Fico lendo tanta coisa que acabo experimentado umas ideias realmente estranhas. Eh, eh, eh! Sabe, aprendi com as técnicas tântricas que a nossa energia se espalha do centro de nós mesmos, que, você conhece, é a nossa genitália – Gaio explicava com humor.

– É mesmo?! Vou prestar mais atenção nisso então, ah, ah, ah! Só não sei de que maneira. Seria mais ou menos como praticar meditação com o ponto focal nesse lugar?! – Sim. Por isso precisa ficar nu! Mas longe de mim, é claro! – Gaio ria. – E faça isso pensando na Marina. Utilize essa “disposição” para conquistar de uma vez o coração dela, porque já está demorando muito com isso.

– O culpado é você! Nos únicos momentos nos quais estive com ela você também esteve junto. E ela só tem olhos para você, cara! – disse Polaris numa entoação queixosa também carregada de desconcentração.

– É, eu sei – admitiu Gaio já mais sério, preocupado. – Sempre soube que ela foi e permanece apaixonada por mim. Tenho certeza de que gosto tanto dela quanto ela de mim. Só que eu a amo como amiga... a única que tenho, por sinal... e ela me ama como o homem de sua vida. Gostaria que ela se desencantasse comigo, mas tenho medo de magoá-la. Se eu arranjasse alguém, Polaris, ao passo que você se empenhe mais para tentar fisgá-la, quiçá nós três acabemos... eh, felizes?.

– Pouco provável – disse Polaris displicente. – Certeza é que, se você arrumar alguma garota, Marina vai se sentir arrasada.

– De certa forma, ela já está – a revelação de Gaio ergueu as sobrancelhas de Polaris. – Foi ontem, à tarde, sabe?. No debate a que fomos juntos, na Biblioteca Central. Marina me pegou flertando embasbacado com uma pessoa – agora Polaris já não exibia tanta indiferença, com os cantos da boca tremendo de excitação. – Infelizmente, tudo entre mim e ela não passou de uma troca de olhares intensos e algumas palavras, embora diretas, que foram suficientes para Marina se azedar completamente comigo. – Então foi esse o motivo de ela não ter ido à aula, hoje?

– Presumo que sim. Todas as manhãs, você sabe, eu a espero para irmos juntos à escola. Mas, hoje, ela não apareceu. Aí fui descobrir a razão por meio de sua mãe, e esta me disse que a filha estava indisposta e que pretendia faltar e que, ainda, gostaria de não ser incomodada por mais ninguém. Escasseada da universidade a saída das jovens colegas, Gaio e Polaris se puseram a andar a fim de pegar os bondes, com fortes características de metrô, com destino a suas casas.

– Por uma questão de estratégia e conveniência, agora cedo não vou insistir com Marina – voltava a dizer Gaio. – Darei a ela um tempo... mas nem longo, nem curto. Quem sabe se você se “engajar” mais daqui para frente, ela não lhe ceda de uma vez por todas?

– Acho difícil – disse Polaris voltando a ficar sem entusiasmo, meio descrente. – Já tentei tanto fazer ela me dar bola. Posso apostar que, se você se afastar mesmo dela, um pouco que seja, ela correrá atrás de você. Não tem jeito, cara. Mas se acredita mesmo que o momento é oportuno, vou tentar mais uma vez, provavelmente a última.

O gramde Jardim Botânico de Aerópolis ocupava uma área de várias dezenas de quilômetros quadrados, onde parte do jardim se estendia por uma magnífica enseada da cidade. Algumas partes suas eram artificialmente aclimatadas por enormes estufas e lá havia tanto plantas nativas quanto exóticas, destinadas a estudos e ao conhecimento do público por livre visitação.

Talvez em virtude da paixão que lhe pulsava no peito, com o inalterado vigor mesmo alguns dias depois, Gaio se sentira por instindo atraído pela grande seção do roseiral. Despido, de corpo esbelto e delineado sem ser calombento de músculos, além do tronco depilado, ele inspirava profundamente um botão de rosas, enlevando-se. Roçava-lhe as pétalas sedosas nos lábios, no entorno da boca, ponta do nariz e bochechas como se fossem os beijos contínuos da jovem que não lhe saía da cabeça. Ali, ao redor, existiam roseiras de todos os tamanhos e matizes de rosa. O chão estava encoberto de pétalas esvoaçantes feito um tapete com vida.

– Oh! Que formosura de bumbum! – exclamou uma voz feminina familiar, de alguém que se acercara sorrateira pelas costas de Gaio.

Ele volveu-se mais em função da reação a um susto solapador do que da intenção em si. Divisou incréu, em seguida, com cada osso do corpo ressoando a solapada cardíaca, um corpo feminino jovem completamente nu tal qual a ele.

– Belo corpo frontal também! – disse outra vez a jovem; a mesma, Gaio constatou relutando em acreditar, do debate sobre romances amorosos da biblioteca por quem se maravilhara. – Por que não anda com ele arregaçado. Os anatomistas evolucionistas não dizem serem a cor arroxeada e o aspecto lustroso da glande um recurso evolutivo para transmitir vigor físico e atração às parceiras sexuais?

A jovem olhava e apontava o dedo indicador sem o menor pudor para o meio das pernas de Gaio, enquanto este, que nunca se vira nem de longíssimo longe numa situação tão embaraçosa em toda sua vida, conservava-se estático, pelando-se de rubor e incapaz de proferir algo encadeado logicamente e claro com, respectivamente, as palavras que lhe turbilhonavam na cabeça e os músculos soluçantes do aparelho fonador.

– Perdoe-me, foi brincadeira! – disse a jovem com sua espirituosidade invariável, se divertindo com a situação inusitadamente hilária em que colocara a si junto do interlocutor. – É uma grande violação de conduta dos naturistas apontar a genitália alheia, não estou certa? – Como chegou até aqui? – titubeante e após muito esforço, numa expiração só, embora ainda meio insuficiente, conseguiu Gaio dizer algo coerente e pertinente.

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