Uma Cidade Mortalmente Eviscerada
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Cap. I:
Vários meses haviam se sucedido. No horizonte interminável de colossais entulhos, outrora tão absurdamente altaneiro e agora impiedosamente desbastado de fora a fora, a múltipla torre-mor se sobressaÃa ainda incansavelmente alta, mas neste momento algo cambaleante entre névoas quimicamente escuras, mesmo com praticamente toda a sua ingente estrutura ainda vindo do chão. E a ceifadeira apocalÃptica não tinha abatido apenas estruturas monumentais de concreto, aço e vidro, mas numerosas vidas humanas, largando por todos os lugares outro igualmente imenso e lugubremente inominável amontoado de pessoas mortas. Seus corpos foram todos sepultados ali mesmo. Contudo o horror que viria depois tornaria esse logo esquecido.
Quase todos os caminhos aéreos de Aerópolis, rompidos estrondosamente pelas lâminas fulgurantes que desciam do céu, agora terminavam em profundos abismos. No fundo de escuro silêncio dos quais, sobre os sepultos que sucumbiram à devastação do clarão de mil sóis, precipitavam os dolorosos olhares de inconcebÃvel inveja dos sobreviventes tão afligidos. De fato, agora os infelizes sobreviventes erravam tanto pelas bordas dos precipÃcios, que muitos acabavam, com ou sem vontade, mergulhando no vazio mortal.
Numerosas torres troposféricas ainda resistiam de pé, mesmo algumas estando muito deslocadas a uma direção, vacilantes, aparentemente a um passo de vir abaixo. Como as furiosÃssimas foices celestes sentaram muitas vezes lateralmente, esses superedifÃcios ficaram impiedosamente desventrados, decepados longitudinalmente por todos os ângulos. Essas entranhas de caliças, colossais colunas, vigas, paredes e lajes cortadas agora terminavam abruptamente também em numerosos precipÃcios assustadoramente elevados.
Praticamente toda à s escuras, a gigacidade, além de eletricidade, não tinha água nem transporte de alimentos. Todas as suas conexões vitais, que incluÃam também calefação, esgotamento, dados, com a ilha-fazenda da Tasmânia haviam sido interrompidas. O até então ubÃquo Googledata, que regia Aerópolis em todos os nÃveis, ficara calamitosamente inoperante. O desgoverno generalizara-se. O caos se achava em toda parte, principalmente nas desesperançadas atitudes dos sobreviventes, que tentavam se matar, quando não matavam o próximo.
Fiapos de ordem procuravam reestabelecer-se. Mas a instabilidade do ambiente chegava ao extremo. Pequenos grupos de pessoas até conseguiam unir-se precariamente atrás de itens de primeirÃssima necessidade, como os estoques de água e alimento que porventura pudessem ser encontrados de resto em algum salvador lugar. Outros grupos, com instinto predatório cada vez mais feroz, quando se deparavam com os primeiros, os massacravam com poderes cada vez mais ilimitados proporcionados pela Técnica Elementar.